segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

#1

Um esboço de sorriso se formou, como fenda que se abre na terra seca. A escuridão da noite que avança já ia, passava pelos portais das janela. Lá ninguém perceberia a rachadura distinta.

A ardência provocada pelo mármore polido dos degraus penetrava pela sola dos pés nus. Os sentidos aguçados. Primeiro, o roçar do tecido leve entre as pernas. Suave e persistente, que no toque inicial proporcionara um gélido frescor de exposição prolongada à brisa marítima. Esse roçar o impulsionava a andar.

Não andou.

O frio já envolvia seus pés, a ardência se tornando anestésica. Nas mãos iniciavam os habituais desconfortos, acompanhados das pesadas borboletas esvoaçando suas asas pelo ventre. São sempre as mesmas, no ventre dos amantes e dos que ficam para trás.

Pensava se agora, suas mãos rígidas, não teriam já se tornado no mármore invencível. Penalidade que fosse por terem percorrido calores tão mais ardentes. Os calores da pele bruta, aquele calor que difere dos outros tantos calores de outras tantas peles.
Estremeceu.
As asas caindo em tempestade, arrastando suas entranhas. Pois logo abaixo, depois do mármore polido, do mármore frio e morto, estava a clareza dos teus olhos mornos.